Tese ao III Congresso PSOL

Contribuição ao III Congresso Nacional do PSOL PSOL: UM PASSO EM DIREÇÃO AO BRASIL REAL I – Apresentação Este texto é uma elaboração coletiva de filiados (as) do PSOL de várias partes do Brasil. Alguns dos elaboradores deste documento reivindicam-se do MES – Movimento Esquerda Socialista, e apresentam-no como um texto alternativo e ao mesmo tempo complementar à outra tese apresentada também por dirigentes do MES. Somos signatários deste texto por entendermos que este aborda e prioriza de maneira mais adequada temas que entendemos fundamentais. Mas não só isso. Este texto esforça-se para dialogar não só com a face mais de vanguarda da militância partidária, mas, sobretudo, com nossa face mais popular, com os mais de 15 mil filiados que deverão reunir-se neste III Congresso do PSOL. Buscar movimentar e organizar esta massa de filiados a partir de um programa partidário mínimo, simples e objetivo, de fácil assimilação pelo nosso povo, é um dos nossos objetivos. Desta forma, estamos abertos a receber apoios, aportes e críticas. Nossa contribuição está à disposição para receber novos signatários que comunguem das mesmas preocupações aqui expressas. Ao final do texto temos os endereços e redes onde podemos ser encontrados. Boa leitura! II – Um breve balanço do curto histórico do PSOL O PSOL foi fundado em 2004. São sete anos que nos separam daquele bonito encontro da esquerda socialista e democrática em Brasília. Naquele momento, quando definimos que o nome do partido seria Partido Socialismo e Liberdade – PSOL, certamente muito poucos tinham noção da força que a idéia de liberdade inscrita no nome do partido iria adquirir ao longo deste início de século. A conexão de socialismo com liberdade expressa hoje mais que uma necessidade da humanidade, mas começa a ganhar os primeiros contornos embrionários de apelo popular, na escala de paradigma mais global, para os povos de todo o mundo, vide mobilizações que cortam continentes na esteira da grave crise econômica mundial que desabrochou em 2007/2008. O PSOL, portanto, mesmo numa quadra histórica de crise conceitual do socialismo, nasceu com o DNA do diálogo com o seu tempo. As condições objetivas e subjetivas que impulsionaram o surgimento do PSOL tinham a marca da indignação contra a traição de uma esquerda que havia chegado ao poder no Brasil. Esta indignação foi encarnada em alguns parlamentares que não se curvaram ao Lulopetismo e se rebelaram contra ele. Estavam ali Luciana Genro, Babá, João Fontes e aquela que seria o símbolo maior daquele movimento: Heloisa Helena. A “guerreira” de Alagoas liderou com energia inimaginável uma campanha nacional e conseguiu entregar à sociedade brasileira em tempo recorde um novo partido socialista de esquerda legalizado, animando uma militância aguerrida em todos os quadrantes do Brasil. O PSOL então surge, no imaginário popular, como um partido radical pela sua coerência, sob o forte signo de uma ética programática na política: contra Henrique Meireles no Banco Central; contra Sarney na presidência do Senado; contra a Reforma da Previdência de Lula. Este apelo, encarnado em Heloisa Helena, rendeu ao PSOL triunfantes 7% nas eleições presidenciais de 2006, força suficiente para garantirmos no STF em 2007 o direito de funcionamento pleno do PSOL, contra uma cláusula de barreira anti-democrática votada no Congresso. Um bom começo. Neste curto lapso temporal, o PSOL agregou importantes setores da intelectualidade de esquerda, Chico de Oliveira de São Paulo e Leandro Konder do Rio de Janeiro são bons exemplos, e novos parlamentares também, como Chico Alencar, Ivan valente, João Alfredo, Maninha e outros. Contudo, o fato de não termos conseguido manter em nossas fileiras o brilhante quadro Cesar Benjamin, candidato a vice-presidente na chapa com Heloisa Helena, já era um forte sintoma de que o PSOL apresentava limites em sua capacidade de aproximação com uma esquerda mais popular, imprescindível para se caminhar numa perspectiva real de poder popular no Brasil. A conjuntura nacional no segundo mandato de Lula foi de inegável refluxo para as pretensões de uma esquerda socialista de massas. O apelo popular do governo, a estabilidade econômica, agregado à cooptação de movimentos sociais, contribuíram para não permitir ao PSOL manter uma dinâmica crescente enquanto projeto político nacional. A ausência de Heloisa Helena com maior peso na conjuntura nacional também contribuiu para isto. O quadro conjuntural geral também dificultou nosso avanço na reorganização no âmbito dos movimentos sociais. Onde mais conseguimos avançar foi na capilaridade nacional do partido nos processos eleitorais locais, em que fomos adquirindo fisionomia e perfil político a partir também de lideranças nos estados. Com o resultado das eleições de 2010, o PSOL apresenta alguns lampejos no sentido de resgatar uma identidade política nacional, com a intervenção de alguns de nossos parlamentares, como Jean Wyllys, Marcelo Freixo e Marinor Brito (sua energia e coragem lembram a Heloisa Helena), que de alguma forma transcendem politicamente seus estados. Com este quadro, vimos que o PSOL não apenas estancou sua dinâmica de crescimento enquanto pólo real de atração para um projeto nacional de esquerda de massas. É nítido que houve sim uma desacumulação neste terreno. Falta ao partido uma espinha dorsal que unifique programaticamente os filiados e militantes em nível nacional. Ter transitado do partido da “coerência” para o partido “necessário” diz muito pouco diante das exigências que estão à nossa frente. O PSOL já teve uma espinha dorsal, que permitiu ao partido vertebrar-se minimamente de forma unificada em nível nacional. Alguns no PSOL podem não concordar com essa avaliação, mas é querer brigar com a realidade negar que com Heloisa Helena o PSOL tinha uma identidade que abarcava desde o militante de uma das ilhas do Pará, a um filiado ribeirinho das margens do São Francisco, passando pelo pantanal matogrossense, por grandes metrópoles como São Paulo e Rio de Janeiro, até os pampas no Rio Grande do Sul. Entendemos também que esta identidade era insuficiente para se constituir um projeto de reorganização de uma esquerda de massas num país com as dimensões e a cultura do Brasil, mas este foi e é ainda um capital político inicial importante para avançarmos. Nesse sentido, o saldo da recente eleição presidencial deveria servir de sinal de alerta para o PSOL. Tanto pelo nosso resultado quantitativo e qualitativo, quanto pelo resultado obtido por Marina Silva. Não existe vácuo na política. Está claro, em nossa avaliação, que em torno da movimentação de Marina Silva há no mínimo fragmentos nada desprezíveis de força social, popular e política que interessam aqueles e aquelas que querem constituir no Brasil uma frente social e política em base a um programa anticapitalista real para a conjuntura brasileira. Os 6 milhões de votos que formaram a diferença entre os votos dados a Heloisa em 2006 e a Plínio em 2010 foram estocados no patrimônio de Marina Silva. Temos a nítida impressão de que o PSOL ainda não fez este balanço com a profundidade necessária, analisando suas implicações para o futuro da reorganização de uma esquerda de massas no Brasil, sobretudo com a emergência da luta ecológica. Portanto, fizemos questão de colocar este breve balanço como primeiro ponto de nosso texto para salientar algumas das hierarquias que percebemos para este III Congresso. III – O PSOL e a nova realidade econômica, política e ecológica mundial A conjuntura internacional que permitiu aos últimos governos no Brasil atuarem com relativa estabilidade está ruindo nos últimos meses. A crise econômica internacional que veio à superfície com mais força em 2008, e apresenta um novo estágio agora em 2011, está trazendo, além de uma nova realidade no terreno econômico global, uma nova perspectiva política. As mobilizações no norte da África e na Europa, como na Islândia, Grécia e Espanha, e recentemente as convulsões na Inglaterra, todas com base no combate às políticas de ajustes draconianos impostos pelos governos e pelos banqueiros, dão mostras de um salto de qualidade na realidade mundial da luta de classes. A combinação destes enfrentamentos com o fato da crise econômica mais aguda atingir centros fundamentais do capitalismo mundial, Estados Unidos e Europa, potencializam a natureza desta crise e diferenciam-na daquelas que lhe precederam. É muito mais grave. O fato da existência de novos e revolucionários mecanismos tecnológicos de comunicação (Internet, BlackBerrys e outros, que escapam ao controle da grande mídia e impulsionam até aspectos organizativos), absolutamente popularizados e globalizados (é o capitalismo mordendo o próprio rabo), converteram os processos mais dinâmicos pelo mundo em ações que na verdade não respeitam fronteiras, e contagiam populações em diferentes níveis em todo o planeta. Aqui se faz necessário um parêntesis: este aspecto em particular vem contribuindo sobremaneira para abrir um caminho de superação da forte crise de paradigmas que vive a esquerda socialista mundial. Cabe a partidos como o PSOL buscar interpretar estes fortes sinais e tentar contribuir para materializá-los em uma proposta política de grau superior, para que não se cometam os mesmos erros dos Fóruns Sociais Mundiais, que apesar do forte apelo social, por falta de saídas políticas reais acabaram por se evaporar enquanto algo relevante no processo de transformação social. Democracia real já sim, mas como? O que é isso? Nesse sentido, são positivos os esforços feitos até aqui pela Secretaria de Relações Internacionais do PSOL com o objetivo de conectar o partido com esses processos. Estes esforços devem ser mantidos e aprofundados, numa perspectiva de construção de uma ampla unidade de forças anti-imperialistas, anti-capitalistas e antiglobalização neoliberal, mas não só nas lutas – que podem por si só não refletir tudo o que aparentam ser -, é fundamental também buscar uma construção no terreno teórico, analítico, com o mesmo espírito dos importantes seminários internacionais que o PSOL já patrocinou. A elaboração teórico-programática acerca destes fenômenos não será alcançada no calor de debates e disputas congressuais – o que seria tão somente fazer demarcação de posições -, mas em fóruns mais amplos, perenes, acumulativos, mais profundos e qualificados. Voltando à crise, outro elemento que se agrega a ela, tornando-a ainda mais dramática para o sistema capitalista, é sua combinação com o esgotamento das possibilidades de exploração anárquica dos recursos naturais. As saídas clássicas de crises anteriores, baseadas no aumento de consumo, esbarram neste limite. Os controles na emissão de gases de efeito estufa, a preservação da cobertura verde do planeta, o controle no consumo dos mananciais de água, dentre outros, passam a ter que entrar nos custos do funcionamento do sistema, exigindo cada vez mais fraudes para seguirem com sua máquina de destruição. Esta realidade acaba impulsionando, pela gravidade da lógica do capitalismo, as portas de saída da crise ainda mais para a periferia política do sistema, que hoje, após a crise de 2008, tem mais peso no tabuleiro político internacional, e que estão presentes no G20. A multipolaridade econômica e política verificada com o maior protagonismo do G20 até aqui poderá agora se aprofundar, visto que economias como China, Índia e Brasil, por exemplo, tendem a se tornar cada vez menos “periféricas”. No caso do Brasil, não é incorreto dizer que esta nova situação poderá destacá-lo ainda mais no subcontinente sul-americano como potência sub-imperialista, o que torna ainda mais difícil capturar antecipadamente sua dinâmica nesta conjuntura mais estrutural. A China é parte protagonista inescapável desta equação, pois na condição de 2° PIB do planeta, já ruma para, nas próximas décadas, ameaçar a primeira posição dos EUA. Em verdade, a participação destes países, dos BRICs e outros, na produção mundial, já vinha se avolumando, tanto pelo maior retorno das taxas de mais-valia como também por conta da exportação de plantas industriais “sujas”, como produção de eletrointensivos (alumínio, aço, etc), que consomem quantidades imensuráveis de energia elétrica. No Brasil, a ampliação do parque de geração de energia elétrica, tanto as grandes hidroelétricas como o programa de usinas nucleares, estão vinculados a esta dinâmica. Em escala global a China, se quiser dar sobrevida ao sistema capitalista, precisará se tornar um centro poderosíssimo de destruição ambiental. Uma “classe média” chinesa consumindo carros e outras mercadorias nos padrões norteamericanos seria um “holocausto” ambiental. Se podemos falar hoje em incertezas sobre os ritmos, o cronograma e a intensidade dos impactos econômicos da crise no Brasil, e este fator é fundamental na mudança do humor da população de conjunto para alterar minimamente a correlação de forças entre as classes, é inegável que do ponto de vista político já há um contágio em setores ainda minoritários da vanguarda, notadamente a juventude (os eventos da juventude no Chile estão dentro desta conjuntura), e o PSOL de conjunto precisa tirar conclusões políticas sobre isto, conclusões que devem estar conectadas com o processo de compreensão mais profunda desses fenômenos, como tratamos em parágrafos anteriores. A experiência do “Juntos!”, por exemplo, que se expressou de forma absolutamente vitoriosa no último CONUNE com uma chapa de oposição unificada, nos mostra que neste terreno há espaços objetivos que já revelam uma nova situação. Temos que cuidar, no entanto, para não cairmos na tentação de buscar “importar” simplesmente “retwittar” a indignação que vem de outros países. Outra certeza incontornável é o papel da luta ecológica nesta nova conjuntura que se abre no Brasil a partir da dinâmica internacional. Todos os caminhos levam as elites políticas do país a avançar na destruição de biomas e ecossistemas para manter as taxas de remuneração do capital especulativo, para manter a política de exportação de produtos primários, de commodities, para receber plantas industriais “sujas” e em busca de maiores taxas de retorno de seus investimentos, como vem acontecendo com força no nordeste do país. IV – As tendências da conjuntura sob o governo Dilma que mais interessam ao PSOL A realidade brasileira está entrecortada pela dinâmica mundial. O destino da crise econômica global selará a dinâmica política mais estrutural no Brasil. É neste mar de imprevisibilidades que navega o governo Dilma. Logo, na cartilha do capitalismo globalizado e da ciranda financeira, o governo vai à austeridade fiscal, o que significa corte de gastos sociais e repressão às demandas populares, vide supressão de R$ 50 bilhões no orçamento no início do ano e mais recentemente o corte no reajuste dos aposentados para 2012. Sem a bagagem política de Lula, Dilma vem fazendo um governo bastante contraditório do ponto de vista de sua governabilidade. Desde os primeiros momentos o fantasmada corrupção ronda-lhe o quintal. Primeiro com Palloci, na Casa Civil, depois com Alfredo Nascimento, nos Transportes, e Wagner Rossi, na Agricultura. No ministério do Turismo, uma operação da Polícia Federal chegou a prender o seu secretário executivo. Até o momento em que fechamos este texto, a presidente individualmente vem fortalecendo sua imagem de austeridade ética, de intolerância com a corrupção. A demissão de Jobim, na Defesa, por insubordinação, e a colocação de Celso Amorim em seu lugar, reverberaram também positivamente na imagem de gestora que “manda” bem. Por outro lado, pesquisas mostram que esta imagem não cola mecanicamente no conjunto do governo, que vem sofrendo quedas de popularidade, ainda pequenas, mas que já causam preocupação. Contudo, a “faxina” de Dilma tem um outro elemento de contradição. Para ser conseqüente, ela terá que cair na armadilha montada pela oposição, que orienta o aplauso à faxina e ao mesmo tempo exige cada vez mais austeridade. Como a corrupção é endêmica, a faxina pode não ter fim, paralisar o governo e, pior, arrebentar sua base de apoio no Congresso. O PR, do ex-ministro Nascimento, já se declarou independente no Senado, o que torna as coisas muito mais caras para o governo. A combinação de austeridade fiscal com austeridade ética é algo absolutamente insolúvel na relação culturalmente fisiológica do Congresso, um balcão de negócios. A luta pelas emendas individuais que nestes dias gera fortes atritos na base governista é, ao mesmo tempo, instrumento de pressão sobre o governo, como também parte da luta intestina entre interesses inter-burgueses. Ou seja, a tendência mais forte no próximo período é de um governo com cada vez mais instabilidade. Episódios como a derrota do governo na votação da Emenda 164 do Código Florestal podem passar a não ser tão raros. Agrega-se a este quadro uma tendência ainda embrionária de fortalecimento de mobilizações sindicais e populares. A propaganda ufanista do Brasil que dá certo, que passa mensagens de otimismo para a população e para uma nova “classe média” que ostenta única e exclusivamente este “título” em função de um novo e frenético padrão de consumo, passa a conviver com esta mesma população sem mais margens para endividamento. Os anúncios de grandes obras e grandes investimentos, como as obras do PAC, da Copa, das Olimpíadas, o Trem Bala, vão se constituindo como algo distante da realidade concreta dos brasileiros. Os enfrentamentos de Jirau, nas obras da refinaria Abreu e Lima em Pernambuco, dos bombeiros no Rio de Janeiro, são parte deste processo, que pode, em se desenvolvendo, dar lastro a condições objetivas para uma dinâmica de reorganização no terreno sindical. Ao mesmo tempo, as obras da Copa, como se dão em várias capitais do país e vêm exigindo remoções de comunidades inteiras, tudo isso combinado com a forte rejeição ao presidente da CBF, Ricardo Teixeira, e ainda com a política de sigilo nos orçamentos das obras, como uma espécie de licença para a corrupção, podem também ser mais focos de tensão e instabilidade. Como já colocamos no tópico sobre a questão internacional, parte das saídas trabalhadas pelo governo Dilma para tentar contornar a crise econômica global são as obras do PAC, dentre as quais têm destaque as usinas para geração de energia elétrica, em sua maioria muito impopulares, como Belo Monte e as Nucleares. Estas obras já são foco de forte tensão social. Estas são pautas importantíssimas na questão ecológica, mas não somente. Também na questão do código florestal os enfrentamentos não serão pequenos. Tanto na questão das usinas como no código florestal, PT e PC do B, partidos que parasitam setores e movimentos sociais fundamentais da nossa classe e da juventude, estão perfilados ao lado dos interesses do grande capital. Estas caracterizações são muito importantes para o PSOL buscar localizar-se bem em processos reais, mixar-se aos movimentos sociais mais ativos, às organizações da sociedade civil com pautas de esquerda, e tentar impulsionar e organizar estas demandas, canalizando-as para um processo progressivo de reorganização popular e sindical, conectado com nossa ação institucional, o que talvez nos permita sair do pântano em que nos encontramos neste terreno, com as minguadas forças sindicais internas do PSOL fragmentadas em várias frentes. Por fim, está na pauta de um setor importante da sociedade brasileira temas relativos aos direitos humanos de maneira mais ampla, que se concentram em boa medida no PNDH3 (Plano Nacional de Direitos Humanos): demandas da população LGBT (“casamento gay”); mulheres (aborto); negros (cotas); comunicação (democratização); arquivos da ditadura (abertura), temas que polarizam a sociedade no campo ideológico. São tópicos sensíveis ao governo por conta da sua base de sustentação militante na sociedade civil mais organizada, e o governo vive se equilibrando em suas contradições. Como partido de esquerda e socialista com perspectiva de massas, o PSOL precisa acompanhar os fóruns mais amplos onde estes debates e enfrentamentos se expressam, e não isolar-se no campo da mera denúncia, de forma que o partido possa ir consolidando posições políticas e adquirindo confiança das organizações que honestamente lutam por estas demandas. V – PSOL: um projeto democrático, popular, socialista e ecológico O PSOL para se afirmar como parte relevante de um processo real de reorganização de uma esquerda socialista de massas no Brasil, não pode ser pautado apenas pelo calor das mobilizações populares, nem pode ser apenas o porta-voz mais honesto e coerente de legítimas demandas setoriais da classe trabalhadora. Não pode ser apenas o “partido das lutas”, da mesma forma que não pode ser apenas um partido “coerente” e/ou “necessário”. Estes requisitos são tão imprescindíveis quanto insuficientes. O PSOL deve buscar a raiz dos problemas sociais mais sentidos do povo brasileiro de conjunto e materializá-los em forma de um programa político de caráter nacional. Este programa deve ser o centro nervoso e o núcleo inquebrantável da espinha dorsal do partido que falávamos no início deste texto. Um programa socialista, popular e democrático deve ser a fusão dialética da consciência histórica da nossa classe com a sua consciência imediata, ou seja, um programa transitório, de ligação, que conecte as inquietudes que o povo entende como inadiáveis e que ao mesmo tempo coloque o povo aprumado de encontro aos interesses escamoteados do grande capital. Não se trata, portanto, de mostrar o caminho da salvação ao povo, numa atitude fundamentalista, como costumeiramente o fazem alguns partidos da esquerda mais ortodoxa. Trata-se de conectar o “egoísmo altruísta” de milhares e milhões, percebido há mais de dois séculos por Adam Smith, contra os interesses sistêmicos do capital. No Brasil este é um desafio para nós. De onde vemos, o PSOL precisa apropriar-se pela raiz de três temas caros e que são infungíveis num processo real de ruptura anticapitalista. a) Luta contra a corrupção, democracia real já e participação popular O tema da corrupção é central. Não se trata de discussão moral ou udenista. A corrupção tornou-se método privilegiado da gestão do capital. Em sua fase de financeirização, a enganação e a fraude tornaram-se peça inseparável da sua jogatina, vide os escândalos dos derivativos na atual crise econômica mundial. Ao mesmo tempo, a incapacidade dos negócios capitalistas em justificar os altos custos sociais e ambientais de seus empreendimentos lucrativos, obrigam-nos a omitir, de forma fraudulenta, a realidade dos seus negócios. Usinas nucleares, por exemplo, só são competitivas em relação a outras fontes quando seus critérios de segurança são flexibilizados, sempre de forma mentirosa. Ao mesmo tempo, a disputa inter-burguesa entre remunerar o capital especulativo, que tem levado a uma pseudo-crise fiscal dos estados, e a diminuição da margem de rapina costumeira dos políticos, levam a uma ainda maior pauperização dos recursos retornáveis à sociedade em forma de serviços públicos e benefícios sociais. As alternativas do PSOL a esta situação estrutural deve ser a democracia real já, ou seja, o fim do monopólio da democracia representativa na gestão dos assuntos de Estado. Popularização de mecanismos de participação direta são alternativas viáveis, como plebiscitos e referendos, em todas as esferas – nos marcos da manutenção dos avanços republicanos que o povo conquistou com muita luta, como o respeito aos direitos fundamentais garantidos na Constituição Federal e que o próprio STF tem refletido -, facilitação de mecanismos de apresentação de Projetos de Lei de iniciativa popular, como autenticação de assinaturas digitais na internet, como já acontece com cartões de crédito, e como propõe um partido irmão, o Partido Pirata – com quem o PSOL-PE se “coligará” nas eleições de 2012 em Recife -, são bandeiras que o PSOL deve assumir de forma absoluta. As direções municipais do PSOL em todo o Brasil, a militância nos municípios, devem exigir, com mobilização, que Planos Diretores das cidades, por exemplo, sejam amplamente debatidos e decididos em processos de participação popular direta, assim enfrentamos na base da sociedade o poder paralelo geralmente exercido por construtoras, empresas de ônibus, de recolhimento e tratamento do lixo e outras nos municípios. Em nível nacional, enfrentamos assim as grandes empreiteiras, os bancos, os grandes lobbyes, a face mais real do grande capital que esmaga os interesses da população b) Luta ecológica em defesa do meio ambiente Como já colocamos no tópico internacional e sobre as tendências do governo Dilma, a questão ecológica torna-se uma demanda de dezenas de milhões no Brasil. Dadas as condições estruturais da economia brasileira, sob a influência dos interesses do grande capital, a agricultura predatória do latifúndio contrapõem-se frontalmente à reforma agrária e à agricultura familiar. O latifúndio agro-exportador hoje interfere até no desenho da infra-estrutura de transportes no Brasil. Ferrovias, rodovias e portos erguem-se ao sabor das pautas de exportação. A transposição do Rio São Francisco e a Ferrovia Transnordestina no nordeste são exemplos. No terreno da agricultura e da questão fundiária no Brasil, portanto, encontramos um campo fértil para um enfrentamento estrutural, onde discutimos alternativas estratégicas de desenvolvimento, e que envolve no mínimo uma vanguarda bastante ampla. Assim, a luta contra a alteração do código florestal, contra especificamente a Emenda 164 aprovada na Câmara dos Deputados, e que tramita no Senado no momento em que escrevemos este texto, são de um alcance estratégico. Somente neste enfrentamento localizado concentram-se os maiores interesses de um dos setores mais bem organizados da elite brasileira. Este tema corta o país de norte a sul. No terreno da infraestrutura, o tema das usinas de energia elétrica é capital, sem trocadilho. Destacam-se Belo Monte e as Usinas Nucleares. Neste tema debatemos padrão de consumo e as gritantes contradições no discurso de viabilidade destas usinas, pois vivemos num país de sol, ventos e muito mar. Nossas alternativas devem passar pela reforma agrária anti-capitalista (cuja proposta deve ser fruto de debate intenso que o partido ainda não fez); pelo fortalecimento da agricultura familiar (fazendo um debate profundo sobre o banimento da utilização de agrotóxicos na agricultura, pois dados confiáveis revelam que cada brasileiro (a) consome mais de 5 litros de veneno por ano, debate que o PSOL também ainda não fez bem); e pela construção de um arcabouço –amparado na academia -, de formas alternativas de produção de energia elétrica “limpa” e renovável, como eólica, solar, maré-motriz, biomassa, etc. c) Enfrentar os banqueiros. Auditoria da dívida pública. Nova política econômica. Em tempos de crise estrutural do sistema capitalista, em que a inversão de capital diretamente no processo produtivo não se reverte em retorno compatível com a expectativa de lucros dos investidores, as finanças públicas, o erário, torna-se presa predileta dos banqueiros. Os orçamentos públicos, montados a partir dos impostos, são literalmente assaltados por tecnologias malandras que se escondem por trás de dívidas públicas, superávits primários e outros artifícios. O Orçamento Geral da União vem sendo sistematicamente assaltado por estes mecanismos. Os pagamentos de juros e amortizações nos últimos anos não são inferiores a 35% do OGU, que hoje orbita na casa de pouco mais de R$ 1 Trilhão. Se formos computar a emissão de novos títulos todos os anos, para rolagem da dívida, os percentuais oscilam próximo dos 50% do OGU. Estes recursos desviados aos banqueiros são aqueles que faltam para uma política estrutural de resolução de grandes problemas da sociedade brasileira: 10% do PIB para a educação; aprovação da Emenda 29 na saúde; PEC 300 dos policiais militares, dentre outros. Esta questão deve ser um dos centros de articulação político-programática do PSOL. Construir alternativas para este gargalo significa enfrentar de cara os banqueiros, o sistema financeiro, que por sua vez articula-se com outros setores do grande capital. Portanto, entendemos estes três temas – corrupção, meio ambiente e dívida pública -, como os centrais, em torno dos quais podemos e devemos armar nosso partido para a militância cotidiana, em todos os cantos e recantos do país. Encarar estes três temas com relativa intransigência é tarefa revolucionária real em nosso país. Há inúmeros outros, é verdade, mas precisamos elencar aqueles centrais, dos quais nenhum de nós “arredamos o pé”; sobre os quais repousarão inclusive nossa política de alianças nos processos eleitorais. O PSOL deve e pode ser conhecido por sua intransigência na luta contra a corrupção, em defesa do meio ambiente e contra os bancos. Entendemos que esta deve ser a nossa espinha dorsal programática de massas. VI – Formação, comunicação e organização no PSOL com bases programáticas O PSOL hoje não tem uma política articulada de organização partidária, nem de formação política. As correntes e grupos internos fazem-no ao sabor dos seus interesses localizados. Creditamos esta deficiência também à falta de uma compreensão minimamente comum das tarefas nacionais centrais que estão ao alcance de nossos filiados, ou seja, não somos, ainda, um projeto claro em construção. Também neste aspecto a definição de objetivos estratégicos palpáveis funciona como elemento organizador. Na medida em que o partido estabelece suas bases programáticas de massa (contra a corrupção, em defesa do meio ambiente e contra os banqueiros), devemos e podemos transformar isto em formação política básica, em cartilhas, em seminários e cursos básicos, em monitores, em vídeos. As ferramentas de comunicação do partido devem estar a serviço desta tarefa também, de forma que o processo de organização partidária aconteça praticamente de forma natural. Esta dinâmica não substitui a política de formação no ambiente do ajuste programático mais fino e estratégico do partido. As discussões mais estratégicas sobre os problemas do socialismo, por exemplo, deverão se dar em níveis que já tratamos em parágrafos anteriores. Da mesma forma os debates e acumulações setoriais (mulheres, negros, LGBT, juventude, sindical, comunicação, cultura), assim como outros debates que achamos importantes de serem desenvolvidos, como o tipo de desenvolvimento social que sugerimos para o país e/ou suas várias regiões; como o debate que o PSOL não fez ainda, mas que se quiser afirmar-se como um partido transformador da realidade do povo brasileiro deverá fazê-lo: que fazer com todo o acúmulo do pensamento de Celso Furtado neste terreno? Seremos ou não continuadores deste legado? VII – O PSOL e as eleições 2012 As eleições são um espaço fundamental de disputa na sociedade brasileira. As transformações que pretendemos não acontecem sem mobilizações populares, mas não passam por fora dos pilares da base democracia que temos hoje. Nestes sete anos de vida, o PSOL conseguiu firmar-se minimamente em função de sua intervenção nos processos eleitorais. Contudo, até aqui, o PSOL, de conjunto, não tem tido um planejamento estratégico de intervenção nestes processos. A lógica das prioridades das correntes internas tem dado a tônica das disputas do PSOL. Torna-se uma espécie de “lógica de mercado” interna. Lançam-se todos, onde se pode e se quer, e depois vemos o que resultou. Esta lógica não serve a um partido que queira de verdade ser um projeto nacional alternativo, de esquerda e socialista. Somos partidários da ideia de que o PSOL deve elencar com antecedência sua presença nas maiores cidades brasileiras e ter um plano de intervenção unificado, harmônico, planejado. Já no início de 2012 deveríamos reunir as principais lideranças nestes municípios e buscar construir um planejamento, um programa nacional básico, pautas comuns, planos de metas, seminários com todos os pré-candidatos das capitais e maiores cidades. Assim vamos vertebrando aquilo que insistentemente chamamos neste texto de espinha dorsal programática, também no terreno do poder local. Neste processo, articulado com os eixos programáticos nacionais, podemos e devemos discutir um programa de poder local que enfrente temas comuns nos grandes centros urbanos e paroquiais: mobilidade urbana; habitação; segurança; educação básica; atendimento à saúde na baixa e média complexidade; democratização orçamentária; pauta ambiental no âmbito municipal; dívida pública dos municípios, pacto federativo, destinação de resíduos sólidos, etc. Em 2008, sob a competente regência do então presidente da Fundação Lauro Campos, Milton Temer, o PSOL editou uma revista com textos de dirigentes tratando do tema do Poder Local. Precisamos partir desta iniciativa para ampliá-la e qualificá-la. Para além deste planejamento, precisamos já ter algumas prioridades nacionais, como Rio de Janeiro, com o Freixo, e Belém, com o Edmilson. O Distrito Federal, com o Toninho, mesmo não tendo eleição em 2012, precisa ser alvo de nossas articulações, de forma que destaquemos o melhor de nossas energias nacionais e recursos para termos o máximo de sucesso nestes intentos, antecipando diálogos no sentido de dar maior estabilidade política para potenciais alianças e táticas mais flexíveis com vistas a um melhor desempenho. VIII– Antecipar o debate sobre 2014 O PSOL deverá buscar já em 2012 constituir uma mesa formal de diálogo com outras forças políticas e sociais no intuito de um entendimento acerca do processo eleitoral de 2014. Como se trata de uma eleição para a presidência da República, a dimensão dos entendimentos programáticos e políticos exige o máximo de antecedência. Nesta proposta, deveremos buscar um diálogo específico com Marina Silva, hoje sem partido, de forma a constituir com seu movimento uma dinâmica de entendimentos, de aproximação programática, estabelecendo fóruns de discussão, com vistas a tentar uma possibilidade de plataforma comum que permita uma frente única de ação eleitoral em 2014, com base nos acúmulos programáticos básicos elencados pelo PSOL. IX – Alteração dos intervalos dos congressos partidários De dois em dois anos o partido mobiliza-se fortemente em torno de disputas de direção em seus congressos. Já estamos em nosso terceiro congresso. Acreditamos que nestes primeiros anos esta dinâmica foi até justificada, mas o partido agora precisa estabilizar-se e priorizar sua ação para fora de suas fronteiras. Sugerimos a este III Congresso alterar o estatuto partidário, estabelecendo intervalos de 3 anos para a realização de congressos. Para efeitos políticos das conferências eleitorais nos anos de eleições presidenciais, o congresso agregaria à sua pauta o tema eleitoral. Esta medida representará uma economia de energias políticas, finanças partidárias (que podem e devem se canalizadas para estruturação de formação e melhor aparato partidário para a militância) e maior estabilidade política para o Diretório Nacional. X – Uma direção política nacional à altura dos desafios políticos A ação política firme e decidida do PSOL nos principais enfrentamentos que estão aoseu alcance depende de uma direção partidária que conte fundamentalmente com estabilidade política para desenvolver suas estratégias e projetos. É no seu congresso que o PSOL elege sua direção nacional, e é neste espaço que devemos, aqueles e aquelas que pretendem construir o partido como uma ferramenta política de esquerda, socialista e de massas, não medir esforços para garantir uma ampla unidade política, coerente e principista. Não interessa ao PSOL a conflagração entre setores partidários que caminham juntos nos enfrentamentos cotidianos internos do partido, mas que num processo congressual são tentados a se mover por outras lógicas. A resultante desta conflagração tem sido uma capitulação do conjunto do partido a concepções que, sabemos, não representam o sentimento das maiorias partidárias. Entramos neste processo do III Congresso com o firme propósito de colocar na presidência deste debate de construção de uma nova direção para o PSOL algo que é insubstituível: a política. Queremos travar com todas as forças que pensam medianamente como nós um franco debate sobre como o PSOL pode dar este passo de qualidade em direção ao Brasil real. Coordenação Nacional da Tese Edilson Silva – Exec. Nac. PSOL / Pres. PSOL-PE Zé Gomes – Dir. Nac. PSOL / Exec. Est. PSOL-PE Albanise Pires – Exec. Est. PSOL-PE Ari Amorim – Vice Pres. PSOL-PE Henrique Monte – PSOL-PE Rodrigo Neri – PSOL-PE Marcos Dias – Pres. PSOL João Pessoa/PB Tárcio Teixeira – PSOL-PB Carlos Leen – Exec. Est. PSOL-MA Ronaldo Santos – Dir. Nac. PSOL / Exec. Est. PSOL-BA Icaro Argolo – Exec. Est. PSOL-BA Waldir Bitencourt – PSOL-ES As demais assinaturas deverão estar disponíveis até o prazo estipulado pela convocatória nacional do III Congresso.

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